Início > Social Media > Utilizador Mimado procura Marca Inexperiente

Utilizador Mimado procura Marca Inexperiente

2011 é o ano da gestão de crise. Já o tinha dito anteriormente e continuo a acreditar que faz sentido. Isto porque 2010 foi o ano do boom das marcas no Facebook – é verdade que todos os dias entram novos players no jogo, mas os grandes que supostamente deveriam estar na rede social já lá estão e já começam a atingir uma considerável massa crítica de utilizadores com quem comunicar.
Mas não é só este facto que me leva a nomear este ano como o ano da Gestão de Crise – casos tão notórios como a Ensitel ou o Zon Iris, que tanto deram que falar no inicio deste ano, marcaram o tom das marcas quanto a como lidar com os consumidores – o lema é “be afraid… be VERY afraid” pois as marcas têm de ter cuidado com os seus consumidores e não pisar no calo errado.

Agora que estamos no rescaldo destes dois casos e podemos parar para observar o comportamentos e hábitos na rede social, são notórios dois sentimentos diferentes – por um lado, o medo dos gestores das páginas relativamente às interacções com os seguidores; e por outro lado, o instinto predador que alguns (aliás, muitos) utilizadores emanam nas suas interacções com as marcas. Os utilizadores ganharam o gosto ao sangue das marcas – e as marcas, na minha opinião, não estão a saber reagir.
Creio que o problema tem duas origens para além dos recentes casos:

1. O território cinzento em que o Facebook se encontra neste momento – o Facebook, neste momento, lembra-me um pouco a febre do ouro no Klondike. Tem uma lógica de “first come, first serve” onde as regras são confusas para muitos e onde não existe uma lógica percebida de espaço privado vs espaço público em contexto digital. Por ser uma plataforma “aberta”, a maioria dos utilizadores, apesar de muito cientes da privacidade das suas páginas pessoais, não têm a mesma percepção das páginas das marcas. Acabam por dizer e fazer o que querem nas páginas das marcas, tendo estas uma reacção advinda do medo da escala e sem um controlo eficaz do seu território.

2. A inexperiência dos gestores das páginas – a inexperiência que aponto aqui é não ter noção de como gerir uma comunidade. Sente-se a clara diferença entre um gestor de uma página que, não sendo um especialista de comunicação de marcas, tenha sido moderador de fóruns antes de o alvorar das redes sociais, e um experiente gestor de relações públicas com zero quilómetros na conversação digital digitais.

A meu ver, os consumidores estão a ser mimados no Facebook da forma errada. Se em relações pessoais e profissionais existem limites e conflitos, o mesmo deverá acontecer no ambiente de rede social. Sendo uma página de marca propriedade da mesma, indiferente da plataforma em que se situa, o comportamento do gestor deverá reflectir uma posição afável e comunicadora, mas ao mesmo tempo segura e ciente do seu espaço pessoal.
Em jeito de investigação, fui pesquisar e tentar perceber algumas regras chave para gestão de comunidades online – a mãe da gestão de crise no Facebook, na minha opinião. E consegui retirar algumas conclusões que acabam por complementar o meu artigo anterior sobre esta temática:

  1. A importância de ser objectivo – Saber claramente manter um tópico e não deixar entrar em derivações que poderão confundir/irritar os intervenientes. É normal no contexto da conversação não-linear proporcionada dos meios digitais, onde existe um gap temporal entre as várias interacções, surgirem diversos assuntos sobre um mesmo post. Num contexto de conversa pode ser interessante e adicionar valor. Numa óptica de queixa, não pode sair do tema sob o risco de ter um efeito de bola de neve.
  2. Não ser defensivo – Se o famigerado caso Nestlé nos trouxe alguma lição é que entrar discussão em defesa dos ataques no contexto de rede social é a fórmula para desastre. É necessário ouvir, fazer perceber que há alguém que está a analisar as situações e a planear uma resposta que agrade a todos. É importante não entrar em justificações corridas sem algum tempo de ponderação. Aliás, no contexto dos utilizadores mimadas de que falei anteriormente, muitos deles estão na expectativa da discussão.
  3. Não deixar ser abusado – Indiferente do número de utilizadores que estão envolvidos numa queixa, o gestor da página é a entidade em quem recaí a responsabilidade de garantir uma conversa clara e sem tons desagradáveis. Há que saber parar uma discussão que, tendo atingido um tom menos próprio, não irá adicionar valor e só irá alimentar mais raiva. Insultos, asneiras, agressões aleatórias, entre outras acções menos próprias, deverão ser lidadas de forma firme e cordial – mas que deixem claro ao utilizador que não pode falar daquela forma pois não irá resolver nada.A título de exemplo:QUEIXA – Os vossos funcionários são todos umas bestas ignorantes que deveriam voltar para a escola.RESPOSTA DO GESTOR – Compreendemos a tua frustração e a queixa que apresentas. É o nosso objectivo ajudar a resolver esta situação. Contudo, existe uma forma mais construtiva de o fazer que não seja pela agressão verbal e a utilização de termos que não são próprios no contexto da nossa página. De todas as questões que tens, qual sugeres que tratemos primeiro?
    Por norma, os queixosos de natureza mais agressiva têm os olhos abertos para as forças e fraquezas da marca. Mostre a sua força para eles o respeitarem. Mostre a sua fraqueza e eles vão-se aproveitar. Tenha calma, muita paciência mas também muita consciência de que está num espaço que pertence à marca.
  4. Utilizar os próprios queixosos para resolver o problema – Respostas que dizem “Obrigado pelo teu input. Será considerado pela marca.” poderia funcionar antigamente – agora é a fórmula certa para continuar um role de conversa desagradável. Não se fechar as queixas e continuar a conversa de forma construtiva só tem vantagens para a marca – desde concentrar a energia deles em função da marca, utilizar os primeiros comentários construtivos para assumir o controlo da conversa, e o melhor de tudo é o facto de uma discussão se transformar numa conversa.
  5. Ou seja, em vez de estancar a conversa, continuem. “Obrigado pelo teu input. Relativamente a esse tema, o que gostarias de ver melhorado para ajudar a resolver?”

  6. Dar continuidade – Um gestor de uma página pode dar umas palmadas nas suas próprias costas quando consegue que uma discussão termine. E a prática comum é tentar que não volte a acontecer e continuar no seu dia-a-dia como se nada tivesse acontecido. No entanto, no cenário actual das redes sociais, é apenas uma questão de tempo até que os queixosos regressem com as mesmas queixas. Para além disso, o momento pós discussão é altamente rentável para quem o sabe aproveitar. Alguns passos que fazem sentido são:
    1. Agradecer pela interacção e continuar a envolver os queixosos nas conversa da marca de forma a fazê-los sentir parte da solução;
    2. Utilizar a massa cinzenta obtida neste momento para convencer a marca a fazer mudanças enquanto o assunto ainda está quente e ainda há consciência da importância dos comentários dos utilizadores;
    3. Convidar os queixosos mais influentes para brainstorms da marca de forma a tentar não só resolver outras questões, como ainda converter os mesmos em embaixadores da marca. Dell Ideastorm ou o My Starbucks Idea, nenhuma destas ideias novas, são dois exemplos bem conseguidos desta estratégia.

Não é fácil ser um gestor de uma página – para quem já geriu comunidades anteriormente é mais fácil na óptica do meio mas poderá faltar-lhe a noção da presença pretendida da marca; e quem é um especialista de PR de marcas poderá não ter noção nas nuances de gestão de uma marca no contexto massificado do Facebook. Tenho a certeza que, quem quiser fazer isto bem, tem de ter muito tempo para devidamente observar a sua comunidade e geri-la com agilidade e bom senso – MUITO bom senso. Mas há um mensagem que quero deixar clara – os utilizadores no Facebook não podem ser tão mimados como têm sido e compete às marcas saber como impedir esta tendência. Sem medos, com paciência, boa educação e capacidade de compreensão das necessidades dos consumidores. No final até pode acontecer que alguns utilizadores desistam da marca – mas os que ficarem serão fiéis e muito mais ligados à marca.

Agradecimentos às fontes de informação:

http://www.readwriteweb.com/archives/get_satisfaction_tuns_facebook_fan_pages_in_customer_service_hubs.php

http://www.quora.com/What-are-the-basic-rules-of-community-management

http://thebrandbuilder.wordpress.com/2010/08/30/facebook-crisis-management-101-how-to-make-sure-your-facebook-page-doesn%E2%80%99t-become-a-pr-trojan-horse/

  1. 24/02/2011 às 17:47

    Excelente artigo. parabéns.

  2. 24/02/2011 às 20:36

    Obrigado! 🙂

  3. 25/02/2011 às 14:46

    Um bom artigo que poderá servir de orientação aos actuais / futuros community managers.
    Ficam por levantar questões como os Passatempos no Facebook e quem mais participa neles, o facto de grande parte das crises quotidianas surgir associada a este tipo de activações, assim como as campanhas de Facebook Premium Ads que comunicam passatempos massivamente – será que destorcem a audiência da página e recrutam detractores?

  1. 17/10/2011 às 14:56

Deixe um comentário